O Pr. Ricardo Gondim é - como se diz - um "quadro" do evangelicalismo brasileiro, escritor, pensador, teólogo, pastor de uma igreja pentecostal moderna e bíblica em SP. Foi articulista na revista evangélica mais referenciada do país - a Ultimato - da qual foi banido recentemente por causa de uma discordância teológica importante.
De repente, por causa dessa opinião teológica e de sua posição quanto à homoafetividade, muita gente se levanta agora para, se possível, trucidá-lo!
E eu acho que é justamente essa reação em série, raivosa, truculenta, nada compatível com a recomendação dos evangelhos, que está corroborando o que afirmou Gondim em artigo recente "Deus nos livre de um país evangélico".
E, quer saber, na minha opinião ele tá coberto de razão. Deus nos livre de um país com maioria do tipo de "evangélico" que temos em abundância hoje em muitas igrejas. Quem lê com mais cuidado sua entrevista à revista Carta Capital – gatilho que disparou a reação raivosa dos “evangélicos” – pode observar, sem paixões, que ele faz ponderações interessantes. Você pode encontrar vários pontos de convergência entre suas análises e os escritos de alguns ex-companheiros que agora, compelidos não se sabe por que sentimentos, o desancam, inclusive com um palavreado nada recomendável.
Gondim diverge do pensamento corrente entre os cristãos evangélicos em alguns pontos, segundo me parece. Mesmo assim, tem muita gente indo rápido demais em decretar (com que poder?) sua condenação ao quinto dos infernos! Respeito muito o Pr. Gondim e me recuso a chamá-lo de herege. Há toda uma vida de testemunho fiel e trabalho na igreja há mais de 30 anos.
O fato de ele ter posto em dúvida agora a doutrina da soberania de Deus é com certeza surpreendente! Constrangedor até. Mas para quem? Para os teólogos, principalmente! Soou como uma provocação! Uma traição! “Que é isso, companheiro?!”. Mas, e daí? Ele, por acaso, decretou isso? Deus deixou de ser soberano e de estar no controle de tudo só porque o Pr. Gondim falou? E, por acaso, Deus corre sério risco de cair no descrédito, caso o batalhão de teólogos-advogados de plantão não se arregimente para defender-lhe a reputação? Coitadinho de Deus! Vamos matar esse Gondim antes que ele acabe com o nosso Senhor!
Ter dúvidas quanto ao controle total de Deus no mundo é compreensível. Sejamos francos: não é fácil encaixar todos os fatos da vida e obter respostas claras e coerentes às questões inquietantes que essa visão impõe. As tentativas de respostas são sempre longas, complicadas, elaboradas, carreadas em pilhas e pilhas de livros e teses que os estudiosos discutem há séculos no seio das academias e depois sintetizam nas escolas dominicais da vida e sistematizam em respostas fáceis nos catecismos. Mas sempre em tese! Na vida real as respostas fáceis desaparecem! Diante do caixão da criancinha estuprada ficamos mudos!
Se formos humildes e deixarmos de nos acalentar com contorções mentais mirabolantes engenhosamente esquematizadas – vontade decretiva, vontade perceptiva, vontade secreta, vontade revelada, lado contrário do bordado, essas coisas que criamos para poder acalmar nossa cabecinha – compreenderemos que nunca compreenderemos! Apelo ao grito do Apóstolo Paulo: “Quão insondáveis seus juízos, inescrutáveis seus caminhos, quem conheceu a mente do nosso Deus?"
Seria de perguntar também, por acaso, o que é que nos redime: a Graça ou a Teologia? Por que se for esta última, meus caros, tem muita, mas muita gente mesmo, iludida, haja vista as discordâncias teológicas – nada simples, por sinal – que marcaram e ainda marcam a história da igreja. E quem é que tem autoridade teológica no mundo para DECRETAR a HERESIA de Gondim e CASSAR-LHE a Graça Redentora de Jesus? Eu respondo agora mesmo: ELE, APENAS ELE, O PRÓPRIO GONDIM, no dia em que ele vier a dizer que renega Cristo como o seu único e suficiente Salvador e Senhor. Afora ele, apenas os anjos do Senhor no final de tudo, quando vierem separar o joio do trigo. Enquanto isso não acontecer - e eu não acredito que aconteça - o Pr. Gondim gozará de minha admiração e respeito. Além de tudo, trata-se de um homem decente, correto e íntegro, que, por isso mesmo e por sua folha de serviços, merece uma divergência sadia.
Eu creio na soberania e no controle total de Deus sobre o universo e, em especial, sobre a história humana. “Até os cabelos da vossa cabeça estão contados”, diz a Bíblia. Porém desisti de tentar uma explicação, tin-tin por tin-tin, como fazem os teólogos, dissecando cada capilar do Altíssimo, ele vivo, e sem anestesia! Não preciso. Sou um daqueles mudos diante do caixão, transmitindo apenas consolo e esperança com um abraço sentido. Um dia, compreenderei! Sem essa fé, simples como a de uma criança, correrei o risco de refugiar-me no racionalismo. Esse risco, acredito eu, Gondim pode estar correndo. Mas não só ele, pois o que são as teologias complexas sobre Deus senão nossas tentativas de torna-lo acessível à mossa racionalidade? Imagino o quanto o Criador deve se apiedar de nós nessa nossa ansiedade de perscrutar o seu mistério, inclusive de pessoas como Gondim que têm a coragem de expressar suas dúvidas e inquietações sem renegar em nenhum momento sua fé em Cristo.
Mas, deixando os teólogos de plantão de mão, para o povão o ponto mais polêmico – foco da ira santa dos santos evangélicos – parece focar a posição de Gondim, favorável à união homoafetiva, sob duplo argumento: para fora, o do estado laico e, para dentro, o da não promiscuidade. Sem querer aprofundar, imagino o cenário daqui há alguns anos, quando a homoafetividade será tão comum que, em nossas próprias famílias, vamos lidar diretamente com ela. Todos nós, queiramos ou não, vamos, pela convivência, nos acostumar, e pelos laços de sangue, nos apiedar daqueles que sofrem carregando essa condição. Então olharemos pra trás e perguntaremos: cadê a minha indignação? Quero ver como muitos dos que hoje gritam, irados, irão reagir.
A perguntinha que não quer calar é: a Graça de Jesus será suficiente para cobrir TAMBÉM esse pecado? Muita gente acha que não. Mas a questão é justamente essa. Já estou ouvindo a resposta: “Não, não! Tem que abandonar!”. Ah, tá, sei, claro, Jesus disse à mulher adúltera “Vai, e não peques mais”. Sim, sim, eu lembro, está escrito. Mas, vem cá, tem alguém aí fazendo isso com relação a seus próprios pecados?
Acredito que seja válida e instrutiva a disputa com Gondim, mas no campo das ideias e concepções, dentro de um clima de respeito, sem enfoque inquisitório. A paixão cega a razão. As lideranças cristãs mais representativas, os pensadores e teólogos brasileiros deveriam aproveitar melhor a ocasião para um debate produtivo e não acionar o trator-rolo-compressor da teologia e da dogmática. Muito menos instigar ao apedrejamento.
Bem, chega por hoje. E como diz o meu irmão Pr. Gondim, Soli Deo Gloria. Enquanto Seu Lobo não vem!
Concordo, principalmente em relação a nova configuração familiar, porém, para quem viveu muito tempo nesse meio não acredito no lider, no homem, no evangelista. Gosto do escritor e pensador.
ResponderExcluirExcelente... esse é o Faustino que conheço!
ResponderExcluirConcordo em gênero, grau e número...
Como não sou muito enturmado na Ecclesia (a institucional, digo), e tampouco sou um leitor assíduo de revistas semanais (por opção e cansaço), estava completamente out of date com relação a essa querela teológica.
ResponderExcluirIsso tudo só me motiva a continuar como estou, ah! povinho!
Respeito, e muito, todos os que sinceramente queimaram pestana em busca de compreender os ensinamentos da Escrituras Sagradas e ainda conseguem repassar seu aprendizado de forma compreensível. Os teólogos cristãos, como se auto-denominam, tomaram para si uma tarefa ingrata, mas graças a eles podemos acessar alguns preceitos quase incompreensíveis.
Aprendi com a vida o quanto padecemos quando exprimimos o que de fato pensamos sem "dourar a pílula".
O que muitos se negam a compreender, e não o fazem ou por auto-engano, ou pelo desejo de pertencimento e apego a uma ordem estabelecida, é que tais resultados de tanto estudo teológico são uma construção coletiva cheia de paradoxos impossíveis em muitos casos de se fazer uma síntese, pela simples razão de que não temos o domínio do conhecimento necessário para isso.
Tal domínio está na mente de Deus. Portanto, inacessível em termos puramente intelectuais. O essencial, a Graça que nos salva, está amplamente divulgada nos Evangelhos; mas mesmo essa só é discernível e apropriada quando se torna revelação pessoal do Espírito Santo.
Quando isso acontece, toda a Escritura agora vira Palavra, Verbo Encarnado, e começa a dar significado até aos mistérios mais incompreensíveis: é a loucura da Cruz.
Podemos então tranquilamente passar ao largo dessas querelas teológicas, que no caso em questão, soa mais como uma "guerra santa" com o significado que a historiografia cunhou para essa expressão.
Assim, sigo o conselho de Paulo, Apóstolo de Jesus Cristo (de Jesus Cristo, visse?!):
"mas ponde tudo à prova. Retende o que é bom;" I Tes. 5:21
No mais:
"Fiel é esta palavra e digna de toda a aceitação; que Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores, dos quais sou eu o principal;" I Tim. 1:15
SOLI DEO GLORIA IDEM
Só não entendi por que na fala do autor o racionalismo se configura "um risco". A pura e simples fé também não o seria? ou melhor, de qualquer atitude humana não decorre um certo risco, ou seja, uma consequência ou desdobramento? Sua fala me pareceu sair como quem sabe exatamente que no SEU posicionamento não há risco, ou, que se nele houver, ele é certamente o "melhor" dos riscos.
ResponderExcluirTomara que eu tenha entendido errado!
Um abraço
http://provocacaofilosofica.blogspot.com
Olá, C.Almeida, obrigado por sua postagem. Tomara que tenha entendido errado. De qualquer modo, você me levou a refletir mais sobre esse ponto. Viver é um risco. E, claro, a fé pura e simples também é um risco. Para reduzi-lo, Jesus recomenda-nos a atitude de uma criança para receber o Reino de Deus. Tento ir por aí. Não sei exatamente que posição tomar em muitas coisas - há se eu soubesse! Copio aqui Chesterton (1874-1936), citado por Gondim: "A razão procura cruzar o mar infinito para, assim, torná-lo finito”. Quando Gondim diz que Deus não pode estar no controle (por um imperativo racional) está refugiando-se no racionalismo tanto quanto os teólogos em sua pretensão de explicar minuciosamente esse controle.
ResponderExcluir"Porque a respeito de vós, irmãos meus, me foi comunicado pelos da família de Cloé que há contendas entre vós. Quero dizer com isto, que cada um de vós diz: Eu sou de Paulo, e eu de Apolo, e eu de Cefas, e eu de Cristo. Está Cristo dividido? foi Paulo crucificado por vós? ou fostes vós batizados em nome de Paulo?" (I CORÍNTIOS 1:11-13)
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