terça-feira, 6 de setembro de 2011

É o fim da Evangelização Pessoal no Brasil?



O Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) acaba de publicar (agosto/2011), o mapa da religião no Brasil. O trabalho da FGV[1] usa os micro dados da Pesquisa de Orçamento Familiar – POF/2009 do IBGE e aponta a volta da queda do catolicismo no Brasil, que havia se estabilizado no Censo 2003 em cerca de 73,8%. Agora o catolicismo tem 68,4% de participação. O ramo evangélico, por seu turno, subiu de 17,9 para 20,3% no mesmo período.

Mesmo sem distinguir todos os gatos do saco “evangélico” – o que, convenhamos, não é tarefa fácil nem para os próprios evangélicos – o estudo aponta que o crescimento dos evangélicos tem mantido uma consistência nas últimas três décadas.  Ainda falta a publicação dos dados sobre religião do Censo 2010, mas o estudo da FGV indica essa tendência.

Mas há outro dado interessante na pesquisa da FGV: o número de evangélicos sem vínculo com uma igreja institucional cresceu muito nos últimos anos, saltando de 4% para 14% - acréscimo de  4 milhões de pessoas[2].  Ou seja, o que os chamados “crentes” viam no catolicismo – o fenômeno no nominalismo religioso (católicos nominais) – agora começa a ocorrer no seu próprio arraial.

Uma informação estatística publicada no site da Aliança Pró-Evangelização de Crianças – APEC , por outro lado, dá conta de que 85% dos conversos evangélicos fizeram decisão até aos 15 anos; 10% o fizeram entre 15 e 30 anos e somente 5% depois dos 30 anos[3].

Vivemos tempos ditos pós-modernos, onde, dentre outras, três características se destacam: o primado do privado, o pluralismo das ideias e crenças e o fim dos absolutos. Religião, mais do que nunca, passou a ser assunto privado. Como diz Rubem Amorese, no seu livro Icabode[4], “dá licença”.  Ao apresentar o plano de salvação para uma pessoa o crente corre o risco de esbarrar no foro íntimo. Religião não se discute mais. Não existe a religião certa. Hoje, mais do que nunca, vale o dito “todos os caminhos levam a Deus”. Ninguém quer mais ouvir falar de “pecado”, nem de “Eu sou o único caminho” – palavras de Jesus.

Por cima de tudo isso há a tirania do “politicamente correto”.  Muitos temas desafiam a fé e os costumes cristãos, como o homossexualismo, casamento, etc.  Se não quiser ser trucidado pelo bullying e taxado de preconceituoso o crente terá que relativizar suas crenças. Ou calar-se.

Antigamente os crentes evangelizavam bastante. Era uma tônica do cristão pregar a sua fé. Aliás, é um mandato do próprio Cristo, quando disse em seu sermão depois de ressurreto: “Ide, fazei discípulos de todas as nações”.  Hoje esse ímpeto arrefeceu muito.  Como se explica então o crescimento dos evangélicos?

Se as informações da APEC estiverem corretas (não é citada nenhuma fonte no site consultado), então a base do crescimento da igreja está focada na evangelização precoce (85% converteram-se até aos 15 anos).  Grande parte desses conversos podemos supor, com certa segurança, são filhos de famílias já cristãs. Trata-se, assim sendo, de crescimento vegetativo.   Outra parte, podemos supor ainda, resulta da evangelização de crianças da vizinhança.  O que “sobra” para o trabalho de testemunho da igreja aos adultos (15% dos atuais conversos)?.

Se 15% dos atuais crentes converteram-se depois dos 15 anos, destacando ainda que, destes, apenas 5% converteram-se depois dos 30 anos, podemos supor que a igreja está tendo dificuldades em pregar aos adultos.  Deixo essa inquietação no ar.

Mas por que meios os evangélicos estão crescendo?  Suponho que seja, principalmente,  por dois: 1) ações institucionais e 2) evangelismo pessoal ocasional.

As ações institucionais não são fruto do testemunho pessoal dos crentes.  Dá-se pelas programações das igrejas. São congressos, cursos, seminários, cruzadas, etc., onde a maioria dos participantes já é crente, mas há visitantes convidados.  Há muitas conversões, embora parte delas não gerem discipulado e permanência.

Outra porta – mais usual – para evangelização institucional são os programas na mídia de massa. Muita gente ouve essas mensagens e aderem às respectivas igrejas. Outras não se adaptam a elas  e procuram alguma comunidade mais de acordo para si.  De um jeito ou de outro, mais gatos pro saco evangélico – (um pouco de humor, gente. Calma!).

Há ainda o trabalho missionário, tanto cultural como transcultural. Mas esse está centrado na ação do casal missionário, com o apoio logístico e as orações das igrejas.

Agora, 2) evangelismo pessoal ocasional.  Segundo me parece, ocorre principalmente pela ação dos crentes em situações fora do comum: pessoas em crise, fragilizadas por perdas diversas (morte na família, doenças graves, catástrofes, infortúnios) que recebem apoio e consolação de famílias, amigos e parentes cristãos, muitas vezes aderem à fé.  Também é o caso de amizades que permitem uma evangelização pessoal mais direta, longe do risco de ser atropelado pelo trator do “politicamente correto” ou pela patrol do particularismo –  “dá licença”.

Em ambas as linhas de atuação o evangelismo pessoal participa a reboque. Não parece ser mais o “carro chefe” da evangelização na igreja cristã pós moderna.   Aquele “sair para evangelizar” aos domingos, de casa em casa, abordando estranhos, distribuindo folhetos; falar de Cristo na escola, na faculdade, nas comunidades, na vizinhança, etc.,  isso parece ser coisa do passado. Ainda está presente em comunidades pentecostais clássicas, mas em queda. 

Então, em resumo, ao que parece, o grosso do crescimento evangélico tem se verificado por ações institucionais, adesões ocasionais e crescimento vegetativo. Seria o fim da evangelização pessoal? 

O fenômeno apontado pelo estudo da FGV – a desvinculação eclesiástica dos crentes – não teria vínculo justamente com a perda desse elemento tão característico da fé cristã – o testemunho pessoal direto?  Estaríamos nos direcionando para um futuro de fé em declínio pela transformação da crença em simples fenômeno cultural (nominalismo religioso)?

Ficam as perguntas.


[1] http://g1.globo.com/brasil/noticia/2011/08/pais-tem-menor-nivel-de-adeptos-do-catolicismo-desde-1872-diz-estudo.html
[2] http://www.amigodecristo.com/2011/08/cresce-o-numero-de-evangelicos-sem.html
[3] https://sites.google.com/site/conexaogilceleti/mensagens-2
[4] http://www.ultimato.com.br/loja/produtos/icabode

3 comentários:

  1. o que é booling? não seria bullying?

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  2. Acontece nos filmes, acontece na vida, acontece na TNT. É assim mesmo. Tem sido assim na Europa (O Rôto Mundo) e na America (EEUU).
    O nominalismo religioso é o caminho natural de qualquer religião que abdica de seus padrões (no caso do cristianismo é o ensinamento dos apóstolos), para se adaptar ao que Paulo chamou "o presente século".
    Primeiro o sal fica no saleiro (sua redoma). Aqui e ali uma pitadinha pra temperar.
    Depois, a umidade entra no saleiro e o torna insípido, e já não serve mais nem para ser pisado.
    A única fé que vai resistir ao final será aquela que estiver dentro de cada um (o Reino de Deus está dentro).
    Nenhuma instituição religiosa resistirá ao anticristo. Historicamente nunca resistiu, é só ver como se comportou a igreja protestante na Alemanha nazista.
    Não se enganem. A igreja é um clube legal, até bacana, sociável, ensina coisas legais e bons valores (algumas, né).
    Mas isso não resiste às portas do inferno.
    A que vai resistir estará dentro de cada um, movida pelo Espírito Santo.
    Este, sim, é capaz de prevalecer e fazer com que nada nos separe do amor de Deus.

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