sexta-feira, 18 de outubro de 2013

A Linguagem da Vida - Parte XI






Minhas anotações sobre o livro “A Linguagem de Deus”, de Francis Collins – Parte XI

Chegamos ao capítulo 10, penúltimo da terceira parte do livro. Collins fala de sua posição com respeito à ligação que lhe parece perfeita entre a teoria darwiniana e a fé cristã.

Como bom cientista Collins não pode ir contra o darwinismo e o acata sem qualquer restrição. Diz que nunca se preocupara realmente com o conflito fé x ciência até chegar ao estudo do genoma. Foi aí que percebeu, conforme afirma, um plano em detalhes do Todo Poderoso que trouxe o universo à existência e estabeleceu seus parâmetros de forma precisa. Collins chama isso de ET “Evolução Teísta”. Significa simplesmente pôr Deus, não nas lacunas, mas no início de todo o processo. Ele faz um resumo conceitual da ET:  1-O universo surgiu do nada, há aproximadamente 14 bilhões de anos. 2-Apesar das improbabilidades incomensuráveis, as propriedades do universo parecem ter sido ajustadas para a criação da vida. 3-Embora o mecanismo exato da origem da vida permaneça desconhecido, uma vez que a vida surgiu, o processo de evolução pela seleção natural permitiu o desenvolvimento da diversidade biológica e da complexidade durante espaços de tempo muito vastos. 4-Tão logo a evolução segui seu curso, não foi necessária nenhuma intervenção sobrenatural. 5-Os humanos fazem parte desse processo, partilhando um ancestral comum com os grandes símios. 6-Entretanto dos humanos são exclusivos em características que desafiam a explicação evolucionária e indicam nossa natureza espiritual. Isso inclui a existência da Lei Moral e a busca por Deus, que caracterizam todas as culturas humanas.

Collins diz que esse ponto de vista é totalmente compatível com o que a ciência nos ensinou sobre o mundo natural e também totalmente compatível com as grandes religiões monoteístas.   Diz que a ET, ao contrário do DI, não se coloca como ciência. Sua verdade só pode ser testada pela lógica espiritual do coração, da mente e da alma. “A crença em Deus sempre exigirá um salto de fé”.

Ao tentar explicar o porque de a ET não ser largamente aceita entre os cientistas teístas ele reconhece o poder das Nomenklaturas científicas e teológicas. Parece melhor a muita gente não se expor às críticas desses opostos. Diz também que a ET harmoniza fé e ciência e por isso não goza de apelo midiático porque a harmonia é chata; a mídia vive de conflitos.  Collins cita alguns religiosos influentes que deram passos na direção da ET, ressaltando os papas Pio XII e João Paulo II.  

Collins faz algumas digressões dobre o nome dessa via, “Evolução Teísta”. Acha que é terrível. Então, depois de algumas elucubrações, cunha uma nova expressão para rebatizá-la: BioLogos, a união da biologia com o Logos, o verbo divino. BioLogos expressa a crença de que Deus é a fonte de toda a vida e a vida expressa a vontade de Deus.

Em resumo a BioLogos parece afirmar a evolução é o método criativo de Deus para a vida e que provavelmente já existiriam outros humanos na terra quando Deus “criou” a alma humana em Adão e Eva.

Porém Collins reconhece que as maiores resistências à BioLogos veem do campo religioso: difícil aceitar que Deus executou a criação por meio de um processo tão aleatório, potencialmente insensível e ineficiente como a evolução darwiniana. Se pudéssemos rebobinar o processo evolutivo retrocedendo-o a várias centenas de milhares de anos e depois o soltássemos o resultado seria completamente diferente do atual. O ser inteligente poderia ser bem diferente do homem como o conhecemos. Poderia mesmo ser um réptil. Collins diz que “a imagem e semelhança” relatada na Bíblia não se refere à anatomia física especificamente, pois Deus não tem corpo. Como Deus está fora do tempo ele já sabia que o processo evolutivo, mesmo aleatório, resultaria no homem. A aleatoriedade do processo só preocupa a nós que estamos presos ao tempo linear, afirma.

Mas o empecilho maior para a aceitação da BioLogos, segundo Collins, é o aparente conflito entre a evolução e os textos sacros de criação em Gênesis 1 e 2. Ou esses relatos descrevem um ato de criação milagrosa aplicado a um casal histórico, diferente de todas as criaturas que já caminhavam sobre a terra ou são uma alegoria da entrada da natureza espiritual (a alma humana) e da Lei Moral em um reino antes desprovido delas. Collins acredita que as duas opiniões são intelectualmente sustentáveis, diante da possibilidade de um Deus sobrenatural. Recomenda cautela em fechar posição sobre esse tema polêmico que já perdura por três milênios de história religiosa. Evoca novamente C. S. Lewis que achava que a narrativa de Gênesis lembra mais uma lição moral do que um livro científico ou uma biografia.  

O texto citado de Lewis é duro: “Durante longos séculos Deus aperfeiçoou a forma animal que estava para se tornar o veículo da humanidade e a imagem dele”. Lewis segue dizendo que essa criatura pode ter existido nesse estado durante eras, antes de se tornar homem, usufruindo de certa inteligência, contudo era só um animal. Então, segundo Lewis, na plenitude do tempo, Deus transmitiu a esse organismo um novo tipo de consciência que podia dizer “eu”, que conhecia Deus e que podia opinar sobre a verdade, a beleza e a bondade.  Quantas dessas criaturas Deus teria produzido? Quanto tempo permaneceram no estado paradisíaco? “Não sabemos”, diz Lewis. Pelo visto, para Lewis, Adão e Eva representariam uma raça, um povo, e não dois indivíduos. Em algum momento aconteceu a Queda, que, para Lewis, é um mistério: “Não temos a menor ideia de qual ato ou série de atos em particular gerou o desejo impossível, que se contradizia”. Comer o fruto proibido é apenas uma expressão literal que não tem a menor importância.

Ou seja, parece que Lewis já partilhava da BioLogos bem antes de Collins, mas sua compreensão parece ser a de que Deus conduziu o processo evolutivo na direção do homem como animal mais complexo e que, no tempo próprio infundiu nele os atributos que o distinguem de todos os outros animais: consciência e fundo moral. Já Collins mantém a aleatoriedade do processo evolutivo e diz que Deus viu o seu resultado futuro aleatório (homem) e então trabalhou nele para torna-lo um ser moral e espiritual.

Eu, que aprecio grandemente C. S. Lewis, confesso-me surpreso com essas suas concepções. Não sei o que dizer. Parece um acerto de contas com reducionismo materialista. Se Deus é Todo Poderoso como se afirma, por que Ele não poderia ter criado tudo de uma vez – as principais espécies, não todas as que conhecemos hoje – deixando-as ao comando da evolução a partir daí? E depois criado o homem?  Mas, deixa. Sigamos.

Collins alerta para o perigo do liberalismo mas diz também que o fundamentalismo literal pode ser tão perigoso quanto. Diz que alguns textos como as histórias de Jó, Jonas e Adão e Eva não possuem marcas históricas suficientes e devem ser interpretados figuradamente.


Collins finaliza reafirmando a superioridade da BioLogos como alternativa consistente e intelectualmente rigorosa, que permite que a fé e a ciência fortaleçam uma à outra como pilares inabaláveis do edifício da Verdade.  Alerta para o perigo de escolhas excludente entre a fé e a ciência: são desnecessárias e ambas negam a verdade. “O Deus da Bíblia é também o Deus do genoma. Pode ser adorado na catedral e no laboratório”. 


No próximo capítulo Collins vai falar de sua experiência pessoal com a religião cristã e de seu encontro com Cristo.  E vai dar uma mensagem final a crentes e incrédulos, cientistas ou não.  Té mais.

Um comentário:

  1. Essa BioLogos acaba caindo na mesma situação da fé pura e simples, e não pode ser verificada. Histórias que não possuem marcas históricas suficientes podem ser verdadeiras apesar disso. A ciência também inclui a historiografia, a etnologia, a história, a antropologia, e a arqueologia. Lacunas podem ser futuramente preenchidas por essa disciplinas, assim como a genética e a biologia molecular tem trazido à tona cada ves mais respostas.
    A questão posta é: crer ou não crer. No mais é bom o exercício intelectual.

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