sábado, 30 de junho de 2012

Gondim teria razão?





Uma das críticas que o Pastor Ricardo Gondim explicitou na sua famosa entrevista à revista Carta Capital, em abril de 2011, que veio a se tornar o marco do início de sua ruptura com o pensamento protestante clássico, curiosamente não foi de cunho teológico.   Gondim, impressionado pelo número de mortos nos tsunamis da Indonésia e do Japão, passou a questionar o controle de Deus sobre a natureza e aderiu à ideia lógica (mas nada bíblica) da cooperação entre Deus e o Homem na construção do futuro e do progresso na terra. É a chamada Teologia Relacional, suportada por outro conceito neoteológico, o Teísmo Aberto, surgida nos seminários liberais norte-americanos, que desveste Deus de sua soberania absoluta. Nesse ponto teológico importante – claramente inegociável - Gondim deixou de se alinhar com o campo da teologia reformada, lamentavelmente. É um fato. Com toda a boa vontade e respeito por ele e por seu trabalho, o rompimento teológico foi inevitável.  Mas, afora o ponto teológico em si, houveram outros, com consequências teológicas, obviamente, ligados a dois assuntos desafiadores para a igreja evangélica: primeiro, sobre a política partidária e segundo sobre a homossexualidade. Este último deixo para depois.

Gondim fez uma afirmação bombástica em um dos artigos que publicou no seu blog: “Deus me livre de um país evangélico”[1].  E esse artigo foi objeto de atenção na fatídica entrevista à Carta Capital[2].  O que Gondim temia? Que o eventual governo de um presidente evangélico caísse na tentação de negar o estado laico, de usar a lei em defesa dos valores cristãos, de aparelhar religiosamente o Estado, satanizar a cultura, higienizar os costumes, puritanizar na marra a vida civil, banir a prostituição, fechar os cines pornôs, proibir as marchas gays, indexar obras filosóficas, etc. Duvida? Claro que o nosso ordenamento jurídico, com o STF à frente, como guardião da Constituição, seria uma intransponível barreira. Nem pensar. E ainda bem! Mas que essa tentação ingênua persiste no subconsciente do “crente comum”, há, existe sim: o desejo de cristianizar o mundo pela força da lei. Já vimos o trágico resultado dessa insanidade.

Lendo alguns posts de crentes em redes sociais fico com a clara impressão de que Gondim está coberto de razão. Gente que pretende ressuscitar o maniqueísmo medieval para espreitar a liberdade cristã de seus irmãos adorariam implantar de cima para baixo e de fora para dentro a moral cristã na sociedade civil nos moldes genebrinos. Oh, Gondim, por que te afastastes da fé na soberania de Deus? Assim perdestes o poder de argumentar de dentro contra a ingenuidade do triunfalismo cristão. Não, não para mim. Nesse ponto, estou contigo. E não abro.

2 comentários:

  1. Os temas que envolvem doutrina são mais complexos do que podemos imaginar. É uma arquitetura de argumentos estão na bíblia (mesmo que descontextualizados, ou mal
    interpretados). Ou seria Arminio um herege, nos dias de hoje? À sua época, sim. Foi confrontado, mas, militou e hoje temos um grande divisões de águas no que si diz respeito ao pensamento. "Calvinista e Arminianos"

    Isso rende mais do que uma reportagem na Carta Capital, seria tema de um grande ciclo de palestras tendo Gondim, como palestra para defender com mais clareza e riqueza de argumentos essa sua tese.

    Seja como for, o mapa do cenário cristão está mudando e sem ser pessimista (o que se vê na TV) é para pior comparando com o que diz as escrituras.

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  2. Admiro o esforço legítimo das pessoas que se debruçam sobre a teologia (uma ciência da fé, embora não ciência pois não pode ser falseada). Mas, cá pra nós: é um saco. Ou como dizia Paulo: o muito estudar é enfado da carne.
    Mas, como um mal necessário, fica aquela sensação de frustração diante das miríades interpretativas, estas que já se iniciam nas traduções distorcidas à gosto das predileções teológicas. Mas afinal, qual linguagem humana poderia expressar a mente de Deus?
    Fica apenas o Testemunho do Espírito. E este é carregado de subjetividades intransponíveis, intransferíveis e não-interpessoais. Por isso a pedrinha branca, com o nome novo, único e indisponível à curiosidade de outrem que não seja o o que a recebe e quem a dá.

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